É
difícil ser negro no Brasil
Sebastião P. G. de Cerqueira-Neto |
Mais uma vez, o Brasil não perde a oportunidade de expressar sua hipocrisia e preconceito, geralmente, comandado por uma imprensa branca e elitista que sabe bem como “entrar” na mente de um povo que, em sua maioria, é desprovido de análise crítica. Confesso que num primeiro momento fui tentado a me juntar e compartilhar dessa avalanche de notícias sobre os erros do senhor Decotelli, mas não poderia enveredar por um caminho que chegasse até o desrespeito com o ser humano, mesmo porque sou um professor na área de Humanas, portanto, um humanista. Por isso, fiz urgentemente uma correção de rumo.
Como dizia o Professor Milton Santos (negro), sabemos fazer a crítica e não sabemos fazer a análise. O caso do professor Carlos Alberto Decotelli, um senhor negro, que não assumiu o Ministério da Educação por graves falhas no seu Lattes, deve ser analisado pelo menos por dois vieses.
O primeiro foi inflar o seu Lattes com informações falsas. Isso é um erro gravíssimo, onde a pena é a exoneração imediata em qualquer instituição de ensino com o mínimo de seriedade. Portanto, altamente condenável para uma pessoa que vai assumir o Ministério da Educação, onde os professores são avaliados pelas suas atividades acadêmicas descritas no Lattes.
O outro viés está na inegável postura preconceituosa que a grande mídia adotou perante este caso. Se não for isso, por que quando a senhora Dilma Rousseff se equivocou no seu Lattes registrando que havia cumprido todos os créditos para o Mestrado e Doutorado na Unicamp não houve tanta repercussão? Aliás, alguém se lembra disso? Provavelmente, não!
A atual ministra da Família e dos Direitos humanos também se equivocou no Lattes, se intitulando Mestra em Educação. O senhor Ricardo Salles, atual ministro do Meio Ambiente, nunca estudou na Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Ricardo Velez Rodriguez, primeiro ministro da Educação do atual governo, colocou no Lattes livros que atribuíam a autoria do mesmo, porém, não era verdade. Wilson Witzel, governador de um estado (RJ) onde a corrupção se tornou endêmica, até hoje não fez pós-graduação em Harvard, uma das universidades mais conceituados do mundo. Todos brancos! A imprensa e a sociedade ficaram abismadas? Lembram por quantos dias esses brancos e brancas que mentiram no Lattes ficaram sendo massacrados pela imprensa?
O massacre que fizeram com o senhor Decotelli só tem explicação pela cor da sua pele. Em 25 de maio, o mundo, inclusive o Brasil, protestou contra o assassinato de George Floyd por policiais norte-americanos brancos. Da mesma forma, o Brasil tenta sufocar e matar o senhor Decotelli. Alguns podem dizer que isso não tem nada a ver!
Eu responderia que, devido a nossa limitação de compreender o mundo em que vivemos, o que nos “choca” é somente a violência física, tendo em vista que a violência moral se tornou comum em nosso país. Por isso, ficamos “revoltados” com a violenta morte do negro norte-americano; entretanto, o nosso comportamento com o senhor Decotelli é semelhante. Somos todos policiais norte-americanos brancos quando o escárnio é a nossa arma para humilhar o negro brasileiro.
Decerto que o senhor Decotelli errou! Bastava apenas se declarar professor, pois não precisa ser um pós-doutor (que não é título acadêmico) para comandar o Ministério da Educação. Bastava ser professor! Mas, parece que ser “apenas” é um defeito. Não por acaso alguns gostam de se intitular “professor universitário”, como se isso fosse uma classe superior a de todos os outros professores, inclusive dos professores de base, esta, sim, a mais importante. É provável que menos de 0,5% da população brasileira não saiba o que é um Lattes.
Entristecesse ver o meu país com milhões de analfabetos tripudiando em cima de um senhor que, no mínimo, é um professor. O erro de Decotelli não pode, de maneira alguma, levá-lo a uma pena de morte moral. Imaginem o que este senhor deve estar passando junto da sua família!
Para os que conhecem um pouco da cultura futebolística, devem se recordar o que fizeram com o goleiro Barbosa, quando levou um gol na Copa de 1950 no Maracanã. Barbosa era negro e dizia que: no Brasil não tinha pena de morte, mas o gol que ele sofreu o condenou à prisão perpetua. E o goleiro branco que sofreu sete gols? Ninguém se lembra mais; só que até hoje falam do Barbosa...
Sei o quanto deve ser difícil ser como Chico Xavier, mas, não somos um país cristão? Se não temos a capacidade crítica de entender o que estão fazendo com o senhor Decotelli, que sejamos complacentes com a vergonha em nível mundial à qual ele foi submetido.
Decotelli entregou a sua carta de demissão ao presidente Bolsonaro (político em quem eu nunca depositaria meu voto, diga-se!). Agora já chega, ou não? O Brasil não tem racismo? A elite não perdoa o pobre, a mulher e muito menos o negro! Já falei isso para vários colegas, que tentaram me convencer do contrário. Parece que infelizmente, neste momento, estou certo!
Alguns questionamentos: onde está o ativismo dos movimentos negros nesse caso? Estão calados porque o senhor Decotelli pertence a um governo chamado de extrema-direita (sou totalmente contra qualquer posicionamento extremo, seja de direita ou de esquerda)? Ele deixa de ser negro por isso? Cadê os brancos e brancas que participam de movimentos sociais que se horrorizaram com a morte do George Floyd? Ou a vida do Decotelli não importa?
Até em situação de desgraça social nós queremos nos parecer com o norte-americano ou o europeu, pois tem que haver um assassinato de um negro nos EUA para nos tornamos cidadãos conscientes. E a quantidade de negros que morrem todos os dias no Brasil?
Mas, acho que nosso fetiche é carregar um cartaz com os seguintes dizeres: "Black Lives Matter!"... Mesmo sem saber o que significa, como tantas camisas que vestimos com dizeres em inglês.
Como dizia o Professor Milton Santos (negro), sabemos fazer a crítica e não sabemos fazer a análise. O caso do professor Carlos Alberto Decotelli, um senhor negro, que não assumiu o Ministério da Educação por graves falhas no seu Lattes, deve ser analisado pelo menos por dois vieses.
O primeiro foi inflar o seu Lattes com informações falsas. Isso é um erro gravíssimo, onde a pena é a exoneração imediata em qualquer instituição de ensino com o mínimo de seriedade. Portanto, altamente condenável para uma pessoa que vai assumir o Ministério da Educação, onde os professores são avaliados pelas suas atividades acadêmicas descritas no Lattes.
O outro viés está na inegável postura preconceituosa que a grande mídia adotou perante este caso. Se não for isso, por que quando a senhora Dilma Rousseff se equivocou no seu Lattes registrando que havia cumprido todos os créditos para o Mestrado e Doutorado na Unicamp não houve tanta repercussão? Aliás, alguém se lembra disso? Provavelmente, não!
A atual ministra da Família e dos Direitos humanos também se equivocou no Lattes, se intitulando Mestra em Educação. O senhor Ricardo Salles, atual ministro do Meio Ambiente, nunca estudou na Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Ricardo Velez Rodriguez, primeiro ministro da Educação do atual governo, colocou no Lattes livros que atribuíam a autoria do mesmo, porém, não era verdade. Wilson Witzel, governador de um estado (RJ) onde a corrupção se tornou endêmica, até hoje não fez pós-graduação em Harvard, uma das universidades mais conceituados do mundo. Todos brancos! A imprensa e a sociedade ficaram abismadas? Lembram por quantos dias esses brancos e brancas que mentiram no Lattes ficaram sendo massacrados pela imprensa?
O massacre que fizeram com o senhor Decotelli só tem explicação pela cor da sua pele. Em 25 de maio, o mundo, inclusive o Brasil, protestou contra o assassinato de George Floyd por policiais norte-americanos brancos. Da mesma forma, o Brasil tenta sufocar e matar o senhor Decotelli. Alguns podem dizer que isso não tem nada a ver!
Eu responderia que, devido a nossa limitação de compreender o mundo em que vivemos, o que nos “choca” é somente a violência física, tendo em vista que a violência moral se tornou comum em nosso país. Por isso, ficamos “revoltados” com a violenta morte do negro norte-americano; entretanto, o nosso comportamento com o senhor Decotelli é semelhante. Somos todos policiais norte-americanos brancos quando o escárnio é a nossa arma para humilhar o negro brasileiro.
Decerto que o senhor Decotelli errou! Bastava apenas se declarar professor, pois não precisa ser um pós-doutor (que não é título acadêmico) para comandar o Ministério da Educação. Bastava ser professor! Mas, parece que ser “apenas” é um defeito. Não por acaso alguns gostam de se intitular “professor universitário”, como se isso fosse uma classe superior a de todos os outros professores, inclusive dos professores de base, esta, sim, a mais importante. É provável que menos de 0,5% da população brasileira não saiba o que é um Lattes.
Entristecesse ver o meu país com milhões de analfabetos tripudiando em cima de um senhor que, no mínimo, é um professor. O erro de Decotelli não pode, de maneira alguma, levá-lo a uma pena de morte moral. Imaginem o que este senhor deve estar passando junto da sua família!
Para os que conhecem um pouco da cultura futebolística, devem se recordar o que fizeram com o goleiro Barbosa, quando levou um gol na Copa de 1950 no Maracanã. Barbosa era negro e dizia que: no Brasil não tinha pena de morte, mas o gol que ele sofreu o condenou à prisão perpetua. E o goleiro branco que sofreu sete gols? Ninguém se lembra mais; só que até hoje falam do Barbosa...
Sei o quanto deve ser difícil ser como Chico Xavier, mas, não somos um país cristão? Se não temos a capacidade crítica de entender o que estão fazendo com o senhor Decotelli, que sejamos complacentes com a vergonha em nível mundial à qual ele foi submetido.
Decotelli entregou a sua carta de demissão ao presidente Bolsonaro (político em quem eu nunca depositaria meu voto, diga-se!). Agora já chega, ou não? O Brasil não tem racismo? A elite não perdoa o pobre, a mulher e muito menos o negro! Já falei isso para vários colegas, que tentaram me convencer do contrário. Parece que infelizmente, neste momento, estou certo!
Alguns questionamentos: onde está o ativismo dos movimentos negros nesse caso? Estão calados porque o senhor Decotelli pertence a um governo chamado de extrema-direita (sou totalmente contra qualquer posicionamento extremo, seja de direita ou de esquerda)? Ele deixa de ser negro por isso? Cadê os brancos e brancas que participam de movimentos sociais que se horrorizaram com a morte do George Floyd? Ou a vida do Decotelli não importa?
Até em situação de desgraça social nós queremos nos parecer com o norte-americano ou o europeu, pois tem que haver um assassinato de um negro nos EUA para nos tornamos cidadãos conscientes. E a quantidade de negros que morrem todos os dias no Brasil?
Mas, acho que nosso fetiche é carregar um cartaz com os seguintes dizeres: "Black Lives Matter!"... Mesmo sem saber o que significa, como tantas camisas que vestimos com dizeres em inglês.
Sebastião P.G. de Cerqueira-Neto
Instituto Federal da Bahia / Campus
Porto Seguro
Líder do Grupo de Pesquisa
Observatório Milton Santos no Extremo Sul da Bahia
Sebastiao Cerqueira-Neto
http://lattes.cnpq.br/0707747014759987
(Foto: com o filho Pedro)
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