quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

PREFEITURA DE NANUQUE PODERÁ GASTAR DESNECESSARIAMENTE MAIS DE R$ 500 MIL COM LICENÇA DE SOFTWARE, ALERTA ESPECIALISTA

Suspeitas e questionamentos: quais são os interesses e os critérios na contratação dessa licença?

O serviço é disponibilizado gratuitamente pelo governo federal; pagar por ele pode ser crime contra a eficiência na administração pública

Jamerson: dinheiro poderia ser aplicado
em investimentos, obras, salários etc
A Prefeitura de Nanuque pagou R$ 135 mil no transcorrer de 2017 pela licença de uso do software administrativo, o que faz projetar para os quatro anos de gestão um total de, no mínimo, R$ 540.000,00, sem considerar possíveis reajustes daqui até 2020. “Esse gasto é, além de exorbitante, desnecessário”, alertou Jamerson Albuquerque Tiossi, especialista em Produção de Software, que também é bacharel em Administração Pública e tecnólogo em Sistemas Informatizados.

“Essa grande soma, que ultrapassa meio milhão de reais em quatro anos, poderia ser aplicada em investimentos, salários, reformas, construção, treinamento, aquisição de máquinas e equipamentos ou, ainda, pagamentos adiantamentos de parcelas das muitas dívidas que o Município tem”, afirmou Jamerson.

O especialista lançou suspeitas e questionamentos, como: “Quais são os interesses e os critérios na contratação dessa licença? O que este software contratado pela Prefeitura oferece que o software livre, disponível gratuitamente no Portal do Software Público Brasileiro, não tem?”

PREFEITURA PAGA POR SERVIÇO QUE É DISPONIBILIZADO GRATUITAMENTE

É público, é de graça.
Por que a Prefeitura de Nanuque paga por ele?

Segundo Jamerson, no mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998 e 1999-2002), o governo federal,  por meio do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, estabeleceu a criação da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação e, subordinado a esta, criou o Departamento de Governo Eletrônico, o que foi confirmado no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006 e 2007-2010) por decreto de 29 de outubro de 2003, substituído posteriormente pelo Decreto 8638/2016, já no segundo governo de Dilma Rousseff (2011-2014 e 2015-2017).

Basicamente, as medidas governamentais estabelecem que o planejamento e a execução de programas, projetos e processos relativos à governança digital pelos órgãos e pelas entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional devem observar algumas diretrizes, uma delas é que “os dados serão disponibilizados em formato aberto, amplamente acessível e utilizável por pessoas e máquinas, assegurados os direitos à segurança e à privacidade”.

O especialista acrescenta que os dados devem estar em formato aberto - “dados representados em meio digital em um formato sobre o qual nenhuma organização tenha controle exclusivo, passíveis de utilização por qualquer pessoa”.

Prefeitura fica refém

“Ao contratar um software particular, a Prefeitura fica refém do sistema que esta empresa adota, daí, com a mudança do governo, surge um novo sistema, um novo formato, impossibilitando assim uma continuidade dos dados”, adverte Jamerson.

SOFTWARE PÚBLICO BRASILEIRO


Preocupado com o formato aberto dos dados, formato este impossível de ser usado quando se usar um software pago, pois o formato dos documentos (DOC, DOCX, XLS, XLSx) são formatos proprietários, o governo federal estimulou e financiou a criação de uma organização chamada Software Público Brasileiro.

Explica que o Software Público Brasileiro é um tipo específico de software livre que atende às necessidades de modernização da administração pública de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e é compartilhado sem ônus no Portal do Software Público Brasileiro, resultando na economia de recursos públicos e constituindo um recurso benéfico para a administração pública e para a sociedade.

PRÁTICA DE CRIME

Jamerson ressalta que, ao escolher softwares fornecidos ou indicados por suas consultorias, as prefeituras cometem crime contra a eficiência, que é um dos princípios da Administração Pública. “Os recursos gastos ali poderiam ser melhor aplicados em creches, investimentos, reformas. Nanuque, em 2017, pagou de licença de software administrativo o valor de 135 mil reais, o que significa que, durante a administração do prefeito Roberto de Jesus, poderá desembolsar cerca de R$ 540 mil, se não houver correção da prestação do serviço".

E completa: “Diferentemente dos softwares pessoais que você usa em seu computador e sobre os quais você é o único responsável, o software usado na Administração Pública deve ser escolhido tendo como princípio basilar que rege a administração a sigla LIMPE: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência.”

VEREADOR ARANHA VAI ABORDAR O ASSUNTO NA CÂMARA, PEDIR INFORMAÇÕES AO PREFEITO E ENCAMINHAR OFÍCIO AO PROMOTOR

Ao tomar conhecimento do assunto, o vereador Antonio Carlos Aranha Ruas já manifestou sua predisposição de levar o assunto em pauta já na primeira sessão de 2018 da Câmara, marcada para o dia 5 de fevereiro. Antes disso, porém, enviará pedido de informações ao prefeito Roberto e encaminhará ofício ao promotor Thomás Henriques Zanella Fortes.

Aranha: prefeito precisa explicar
“O prefeito de Nanuque possui em seu currículo a experiência de ter assessorado outras prefeituras, por isso precisa explicar o que vem acontecendo em seu governo. Não vamos fazer julgamentos precipitados, por isso quero que ele explique o porquê de a Prefeitura de Nanuque pagar esse valor tão alto com licença de software”, disse Aranha.

ORIGENS

O professor Jamerson Tiossi reporta à história para dizer que, em 1976, um dos primeiros feitos de Bill Gates foi defender que o código fonte dos softwares o código que explica passo a passo o quê o programa deve e pode fazer deveria ser segredo. A moda pegou e a partir daí passou a ceder a licença de uso apenas, não mais o software em si.

Como resposta a isto, Richard Stallman criou o conceito do software livre, que hoje é formalmente conhecido como “software livre/código aberto(SL/CA), um modelo de software produzido e distribuído em comunidade e que obedece a quatro diretrizes básicas que incluem distribuir o código, permitir a alteração e redistribuição do código. Note que não se encontra nas diretrizes a “gratuidade, mas o foco do SL/CA é o serviço, e não o código, já que qualquer um pode baixar o código e criar/alterar o programa.

A imagem do SL/CA ficou vinculada ao Linux (o nome de um kernel de SL/CA) e há dezenas de distribuições com este kernel, inclusive talvez seu celular se você utilizar o Android. Ou seu navegador se você usar o Mozilla Firefox ou o Google Chrome. Há aplicativos que rodam em qualquer sistema (chamados multiplataformas) e há aplicativos que necessitam de requisitos que só as distribuições Linux possuem.

O SL/CA cumpre sozinho e de imediato três itens da lista: é legal, permite-se a publicidade ao projetar dados em formatos que todos possam acessar, e é eficiente, pois seu custo é zero, possibilitando a aplicação dos recursos em outras áreas. Por extensão, é impessoal (fornecido por uma autarquia do governo federal e com o código fonte) e, certamente, a escolha mais moral a ser tomada.


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